Hoje venho falar de um assunto que há um tempo reflito. Desde que me tornei mãe, a vida se transformou completamente. No início da rotina maternal, e ainda por um bom tempo, nossa vida fica de cabeça para baixo, como dizem. É preciso uma adaptação. Pós-parto, puerpério, morte da mulher que se foi um dia e renascimento. Nasce uma nova mulher e uma mãe. E demora, até que nos conheçamos novamente. Passamos por gangorras emocionais, mergulhos profundos em nosso Eu. Resgatamos memórias, sentimos dores físicas e emocionais, comuns neste processo longo de autoconhecimento que a maternidade traz. Ficamos perdidas. Adentramos um novo Eu e um novo mundo com um bebê frágil e indefeso nos braços. O mundo interior mudou e consequente tudo mudou a nossa volta. E em meio a tudo isso, também nos doamos inteiramente a este novo ser que geramos, demos a luz e criamos.
Acumulamos responsabilidades e devido a tantas mudanças de uma vez, muitas de nós se esquecem de si. São tantos sentimentos, dores, culpas e dúvidas junto a tantos novos afazeres e deveres de uma mãe, que a última coisa que pensamos é em cuidar de si. Cuidamos de tudo, para que sejamos a melhor das mães para o filho. A mãe é a última a comer, a última a tomar banho, pois um bebê chora desesperadamente pela sua presença. A mãe cuida, desde que o mundo é mundo. O pai também cuida, mas sabemos como somos cobradas e julgadas de forma diferenciada, além da auto cobrança. Então, muitas de nós vestimos-nos de mãe e esquecemos a mulher que somos. As necessidades da mulher mãe. Somos mães, mas também somos humanas, somos filhas e mulheres. Muitas de nós passamos pela invisibilidade materna. Abraçamos o mundo, trilhamos um caminho de renúncias, porém não somos verdadeiramente vistas, muito menos temos nossa jornada intensa realmente valorizada na sociedade. Todos os olhos são para o bebê, mas quem enxerga a mãe? Muitas vezes, somente a mãe da mãe a enxerga de verdade. Muitas de nós não conseguimos nem nos reconhecer mais durante este processo. Indagamos: E agora, quem sou eu? Vejo que o autocuidado é uma chave que nos traz de volta para quem somos. Assim tem sido comigo.
Existem diversas formas de autocuidado. O autocuidado em essência é o olhar para si e atender suas próprias necessidades. Cuidar de si, primeiramente. Como saberemos o que precisamos realmente? Se observando e procurando se conhecer; Para isso, necessitamos, assim como qualquer pessoa, de um tempo para si. Tempo para si, algo que se torna até um desafio para muitas mães de bebês ou de crianças pequenas. Vejo que é preciso primeiramente se permitir, mesmo que a culpa materna se apresente. É difícil, mas é necessário.
Quando minha filha tinha quatro meses, ainda estava no aleitamento materno exclusivo, eu não tinha uma rede de apoio presencial aqui onde moro, nem familiares por perto. Tinha poucas amigas realmente presentes no meu dia a dia. Participava ativamente de um grupo virtual de uma roda de apoio a gestantes e mães, e havia uma senhora que me auxiliava com a limpeza da casa semanalmente, sou bem grata por isso. Mas, eu passava grande parte do tempo sozinha com o bebê em casa, meu esposo viajava a trabalho e eu mãe de primeira viagem. Tirava muitas dúvidas neste grupo virtual da roda de mães. Além da solidão materna, natural do momento, havia o isolamento. Permiti-me retornar a Yoga que eu já praticava anteriormente a maternidade. Tomei uma decisão e recebi o apoio do meu esposo. Eu estava com dores na coluna por estar a meses sem atividades físicas, e me sentia sozinha e isolada com um bebê em um apartamento. Ao mesmo tempo, pensei em como fazer isso, pois ela era tão bebê. Organizamo-nos e eu retornei a Yoga uma vez por semana, parece pouco, mas fez muita diferença. Porque é algo que me faz bem e eu me permiti ter esta hora dedicada a mim, em meio ao puerpério intenso e solitário. Teve culpa? Teve. Teve insegurança? Teve. Medos? Também tive. Mas fui assim mesmo. E foi a melhor coisa que fiz por mim naquele momento. Fez-me um bem danado e auxiliou bastante a retornar renovada internamente para meu bebê; A respirar novos ares e cuidar do meu corpo e mente, além da maternidade. A cuidar do ser que eu estava a me tornar e da mãe que eu vinha aprendendo a ser. A me observar por dentro, com mais calma. Desde então, comecei a me permitir a uma rotina de autocuidado também após a maternidade, já que quando não tinha filhos era bem mais fácil ter esta rotina. Mesmo que sejam poucas horas do dia, por três ou quatro vezes durante a semana. Faz-se necessário.
Há um ano retornei aos treinos na academia, e continuo a prática de Yoga. Vejo na academia, mães que levam suas duas crianças por não ter opção de quem fique com elas. Mas não desistem. Priorizo não marcar nada nos horários que reservo para estas atividades. Procuro ser constante e não deixar de ir por qualquer motivo. Vejo que precisamos nos priorizar. Não é egoísmo, é uma construção do amor próprio e autocuidado. Além de preservar nossa saúde mental. Dia desses me permiti deixar tudo como estava e ir ao cinema com amigos. Mães carregam consigo correntes, que não são tão leves como gostaríamos que fossem, ou como romantizam. Vejo que, nós mães, que estamos sempre cuidando dos filhos, estando longe ou perto deles, o tempo todo antenadas na criação e nas necessidades deles e da família como um todo, necessitamos olhar com carinho para as nossas necessidades, para que a gente continue em plenas condições de doar o nosso melhor e ainda sermos capazes de olhar para si. É preciso de apoio para isso, mas também de se colocar como prioridade em algum momento.
Muitas mães se anulam por anos, após a maternidade, devido à falta de uma rede de apoio, culpas, insegurança, jornadas triplas, cansaço, desânimo e também por não se permitirem. Por sofrerem julgamentos diversos quando se permitem a realizar algo só para si, muitas vezes julgamentos até da própria família. Como se a mãe não pudesse vivenciar os prazeres que a vida nos proporciona, saborear conquistas e tivesse que ser somente mãe. Assim como todos, a mãe também pode: viajar, namorar, estudar, trabalhar, sonhar, realizar-se e ser feliz sem precisar ficar dando justificativas e explicações a sociedade para isso, com responsabilidade. Não vemos com frequência homens pais sendo questionados constantemente com quem deixaram seus filhos para fazer algo para si, ou sendo julgados por simplesmente se priorizarem. Mesmo que enfrentemos muitas dificuldades impostas por uma sociedade ainda muito patriarcal, muitas vezes é preciso que a gente tome uma decisão e siga firme no propósito. Surgirão, a partir da decisão, maneiras de realizar. Eu concordo com aquele lema: “filhos precisam é de mãe feliz”.
Mas como fazer uma rotina de autocuidado? Identifique suas principais necessidades no momento. Pode ser que seja cuidar mais da sua saúde física, até fazer um check-up de saúde, sair sozinha com amigas para conversar de forma mais frequente, realizar atividades físicas ou esportes, realizar uma rotina de cuidados frequentes com a beleza, uma terapia, uma sessão de acupuntura, uma corrida diária em um parque, aquele lazer que você adorava e nunca mais teve tempo depois de ser mãe, uma aula de dança, uma meditação. Reflita, o que você precisa mais no momento? Pode ser até se permitir não fazer nada, parar um pouco e diminuir o ritmo. Identifique o que te faz realmente bem e que você precisa fazer por você, pois ninguém o fará. E o principal: permita-se realizar, persevere. Mesmo que as dificuldades se apresentem, pois com certeza elas aparecerão, pois não é um caminho fácil.
Há culpa, às vezes há desânimo, falta de apoio, mudanças na rotina, outras necessidades, outras prioridades e até desistência temporária. Mas lembre-se que todo amor começa em si. A meu ver, através do autocuidado nós podemos aprender a nos amar mais e nos conhecer mais também. Pois, é um momento que reservamos para estarmos mais conectados com nós mesmos além de cuidar de si. Que nos permitimos nos amar também e dar atenção às nossas necessidades. O autocuidado nos permite renovar nossas energias e refazer-se aos poucos internamente, fortalecendo nossas bases interiores. Para mim, o autocuidado me permite observar as fragilidades da minha existência e fortalecer-me para enfrentar a vida e seguir adiante. Me salva, me ancora e me traz leveza nos dias mais difíceis. Autocuidado é essencial para todas nós. Mães, vocês se permitem?
Fotografia registrada do celular, no Parque Amantikir, em Campos do Jordão-SP, Brasil.